Capítulos (2 de 8) 05 Aug, 2018
Capítulo 2
Capítulo 2: Rei de Eternia
Terça-feira, 12 de outubro de 2023, 6:45 h.
Ao sair de meu apartamento, sonolento por ter dormido apenas uma hora durante a noite, me deparo com minha parceira de elevador esperando-me ao lado de minha porta. Acenei com a mão e segui para o elevador, com ela me acompanhando mais atrás. Percebi que estava abraçada em algo enrolado em um pano, desviando o olhar sempre que eu a olhava de canto.
Pelo caminho até a escola, ela também ficou me acompanhando, alguns mais atrás.
– Ei garoto, acho que está sendo seguido. – disse o fantasma ao meu lado. Permaneci andando em silêncio – Não vai falar nada? – continuei andando em silêncio – FALA ALGUMA COISA SEU MALDITO!!
– Não posso ficar falando sozinho na rua, caralho!! – Gritei, furioso.
Muitas pessoas pararam e ficaram me olhando com estranheza. Baixei a cabeça e acelerei o passo.
9:45 h.
Estava no intervalo da aula, sentado em um banco embaixo de uma árvore, no pátio, usando a sombra da árvore para fugir do sol.
– Primavera é a melhor estação de todas.
– Verdade. – O fantasma estava sentado ao meu lado, com os braços abertos sobre o encosto do banco de madeira branca.
– Qual seu nome afinal? – Perguntei, curioso.
– Rinkashimikutamo Rokugawa.
– Cara, teus pais deveriam te odiar por terem te dado um nome desses.
– Não conheci meus pais, cresci como escravo.
– Que droga em, Roku.
– Roku?
– Foi a única parte que decorei da bíblia que é teu nome.
– Como ousa caçoar de meu nome? MALDITO! – Ele me deu um chute que me derrubou do banco.
Ficamos nos olhando, espantados, pois nenhum dos dois sabia que um podia atingir o outro.
– Escuta aqui, estamos presos nisso juntos. Eu quero tanto quanto você ficar sendo assombrado por um fantasma chato como você. Então vamos cooperar para nos livrarmos um do outro rápido. – Voltei a sentar no banco.
– E você, como se chama?
– Tyson Lavinier.
– Lavinier? – Ele começou a gargalhar.
– O que tem de errado com meu sobrenome?!
– É afeminado! Senhorita Lavinier! – Ele gargalhava.
– Saco! – Cruzei os braços, emburrado.
– Será que vocês dois podem ficar calados? Estou tentando dormir um pouco aqui. – Disse uma voz que veio de cima de nós.
Ao olhar para cima, vi uma garota, de olhos fechados, deitada nos galhos da árvore. Eu já tinha a visto antes. Kiria Muray. Era a garota que também teve que aguentar uma manhã inteira na sala da diretora. Mas... Espera ai!
– Você pode ouvi-lo?! – Indaguei, espantado.
– É claro. Você não deveria andar com seu espírito guardião de forma tão imprudente.
– Você sabe como me livro dele?
– Sim.
– Como?! – Perguntei ao mesmo tempo que Roku.
– Fácil. Se torne o Rei de Eternia e ganhe o poder de fazer seu espírito repousar em paz.
– E se eu matá-lo? – Indagou Roku.
– Ei! – Protestei.
– Que foi? É uma hipótese. – Explicou ele em meio a um sorriso.
– Um espírito guardião pensando em matar seu invocador? – Kiria nos olhou de canto, com os olhos ainda semifechados – Que peculiar. Se o invocador morrer enquanto o espírito guardião estiver ligado a ele, o espírito desaparecerá.
– É MELHOR FICAR FORTE SEU MALDITO!! NÃO QUERO DESAPARECER!!
– PARA DE GRITAR NO MEU OUVIDO!! SACO!!
Kiria deu uma risada, então percebi que eu estava gritando sozinho e muitos olhares de estranheza dos outros alunos no pátio, estavam direcionados a mim.
– Você parece não saber como funciona ser um invocador.
– Não faço a menor ideia.
Ela desceu da árvore, sentando no banco.
– Invocadores do mundo todo lutam para se tornarem o Rei de Eternia, ou seja, o rei do mundo, conseguindo assim um poder igual ao de um deus. Nós mulheres que nascemos com este dom, não podemos ter tal posto, então mesmo que uma mulher seja a invocadora mais poderosa, terá que escolher um marido para se tornar o Rei de Eternia.
– Por que isso?
– Ninguém sabe ao certo. O espírito mestre que controla nosso mundo, Eternia, simplesmente não entrega seu poder a uma mulher. Machista pra caramba.
– Hum... bem... então, você poderia me ajudar... Já que estudamos na mesma escola e ambos somos assombrados... Então...
– Não. Eu já tenho um escolhido em vista. Ele também é da cidade e nunca perdeu uma batalha. Diversos invocadores do mundo todo viajam até aqui para desafiá-lo, mas poucos são os que sobrevivem a uma luta contra ele.
– Espero nunca enfrentá-lo...
– Então pare de andar com seu espírito guardião tão a vista. Com o tempo aprenderá a torná-lo invisível. – ela estalou os dedos e uma garota de asas negras, cabelo curto, um olho azul e outro castanho, surgiu ao lado dela. Parecia um demônio pelas asas, mas era bela demais para ser um.
– Que linda... – Sussurrou Roku ao meu lado.
– Essa é Penelope, meu espírito guardião.
– Legal.
Kiria estalou os dedos novamente, e o espírito sumiu.
– Vou no refeitório comer algo. Se cuide, invocador.
– Você também. Até mais. – Fiquei acenando para ela.
– Acho que ela lhe ameaçou, Ty. – Disse Roku, também observando Kiria se afastar.
– Ty? – O olhei com estranheza.
– “Foi a única parte que gravei do seu nome”. – Debochou Roku.
– Tsc. Não tem jeito. – estalei os dedos, fechando os olhos no intuito de concentrar o tal karma. Quando abri, Roku não estava mais ao meu lado – Funcionou.
– O que funcionou? – Disse ele atrás de mim.
– Waa!! Não me assusta! Era pra você estar invisível!
– Se controle, tem gente vindo.
Olhei para frente. A garota do elevador vinha em minha direção.
– O-olá! Me chamo Suski Mirali, moro no sétimo andar do seu prédio, tenho 18 anos e sou de Sagitário.
– Hum? – A olhei, confuso.
– A-ah. Desculpe. – ela desembrulhou o misterioso conteúdo embrulhado em um pano ao qual estava abraçada mais cedo, revelando quatro fatias de bolo – Eu fiz para você, para agradecer por ter me ajudado ontem...
– Agradecer? – Continuei encarando-a, estranhando a situação. Por anos pegamos o elevador juntos e nunca conversamos, e do nada ela cozinha para mim?
– De-desculpe. Não gosta de bolo?
– Fale alguma coisa seu maldito! Não fique ai a olhando com cara de idiota além da que já tem! – Esbravejou Roku.
– Não é isso, apenas estou feliz pois estou realmente com fome. Obrigado, Saski.
– Suski.
– Desculpe, Suski. Mas vamos, coma comigo.
– Oh, não, fiz tudo para você.
– Por favor, vou me sentir mal comendo sozinho.
Ela corou, sem jeito.
– Está bem, apenas uma fatia.
Peguei uma fatia e em uma mordida já foi a metade dela, enquanto Suski comia devagar.
– Então, como se sente? Ainda está dolorida?
– Um pouco, mas vou ficar bem. Minha irmã mais velha está cuidando de mim.
– Você mora com sua irmã?
– Sim. Meus pais se separaram e foram morar em outro país com seus novos parceiros, então acabei morando com minha irmã, que já tem uma vida bem estruturada. Ela é 7 anos mais velha do que eu.
Peguei outra fatia de bolo.
– Isso tem um cheiro ótimo. – Roku estava praticamente babando em cima do meu bolo, então fiquei fugindo com a mão, o que parecia que eu estava brincando com a comida.
– Legal. Deve ser divertido morar com a irmã. – Enquanto eu falava, Suski seguia minha mão com os olhos.
– Hum? – ela voltou a olhar para mim – Ah, sim. É muito divertido mesmo. – Ela terminou a fatia dela.
– Pode pegar a última.
– Última? – ela olhou para o pano, não havia mais nenhuma fatia – Acabou.
– Ué. – olhei para cima, Roku estava sentado em um galho da árvore, comendo o bolo – Eerrr, bem, vamos voltar para a sala? Eu lhe acompanho até a sua. – Ela concordou com a cabeça, enquanto eu torcia para ninguém ver uma fatia de bolo flutuante em meio aos galhos da árvore.
Acompanhei Suski até a sala dela, tendo uma conversa casual pelo caminho, sobre bandas prediletas, filmes favoritos, passa tempos e coisas do tipo.
12:07 h.
Voltando para casa, uma garotinha, deveria ter seus 10 anos, vestindo uma capa de chuva branca, surgiu na minha frente.
– Venha. – Ela segurou minha mão e saiu me puxando. Eu me deixei levar.
Ela me levou até os fundos de uma fábrica abandonada, a qual o teto havia desabado há muitos anos.
– Por que me trouxe aqui?
Ela se afastou um pouco e então tirou uma espada katana de baixo de sua capa branca.
– Fluy! – um espírito com um chifre no meio da testa e pele vermelha, surgiu atrás da garota, então ele esfumaçou e juntou-se a ela, como se tivesse a possuído. Um chifre surgiu na testa da garota e seus olhos cor de mel se tornaram ameaçadores.
– Bem, acho melhor eu ir andando, não quero chegar tarde em casa, sabe como é. – Disse, me distanciando.
– Ty! – Gritou Roku, encarando a garota.
– Eu sei! Ela é uma invocadora.
– Desculpe por isso! Gyaa!! – Ela avançou contra mim.
Eu tentei correr, mas ela era muito rápida.
– Má ideia! Má ideia! Má ideia! Má ideia ter vindo aqui!
– Ty! – Roku estendeu a mão para mim. Quando bati na ponta dos dedos dele, ele parou a espada bem a tempo antes que ela me atingisse as costas quando tropecei, prensando-a com as duas mãos.
A garota soltou a espada, desferindo um golpe com uma kunai contra o rosto de Roku, que não conseguiu acompanhar os ágeis movimentos dela, conseguindo apenas desviar um pouco a cabeça para o lado, tendo o canto de sua boca cortado, fazendo sangue jorrar em seu rosto.
– Roku! Para de pegar leve só porque é uma garotinha!
– Não to pegando leve seu maldito! Você é fraco! Seu karma não é forte o bastante para que eu possa lutar contra ela! – Roku sofreu um chute no estômago, caindo por cima de mim.
A garota se aproximou rapidamente com sua katana para dar o golpe final.
– Desculpe por isso. – Ela levantou o braço para desferir o golpe, mas uma pedra foi em sua direção, fazendo ela se defender.
Um ser de preto surgiu do nada, avançando contra a garota.
– Kiria? – Me perguntei.
A garotinha foi desarmada, ficando no chão, indefesa.
– É o seu fim.
– Kiria, não a mate!
Ela me ignorou, perfurando o coração da garota no chão, matando-a.
– Ty... – Roku ficou ao meu lado enquanto eu olhava a cena, de joelhos, em choque.
Kiria limpou o sangue na capa da garotinha e guardou sua katana, vindo em minha direção até parar ao meu lado.
– Eu lhe disse, você deixa seu espírito a mostra, isso atraíra cada vez mais invocadores tentando lhe matar. Você entrou em uma guerra onde é matar ou morrer. Se tiver misericórdia de seu inimigo, morrerá. – Ela passou por mim, saindo caminhando tranquilamente.
Levantei e juntei minha mochila, saindo daquele lugar com o olhar vago. Pelo caminho até em casa, eu e Roku permanecemos em silêncio.
13:17 h.
Em casa, fiz Roku ficar em forma física para que eu pudesse costurar sua boca e fazer um curativo. Ele estava sério, como se algo o incomodasse.
– Pronto. – terminei o curativo. Ele voltou a sua forma de espírito – Roku... Sei que está bravo por ter sido derrotado, mas não sou um guerreiro e nem sei direito ainda o que é esse tal de karma. Então apenas... Tente não remoer isso desnecessariamente. – Fiquei sem resposta. Fui ao banheiro tomar banho.
Pouco tempo depois, Roku veio falar comigo.
– Eu não lhe culpo.
– QUEEEÊ?!!
– O que foi?
– NÃO VENHA FALAR COMIGO ENQUANTO TOMO BANHO!!! SACO!!
– Garoto tímido. Ambos somos homens, não tens do que se envergonhar… Hm? Creme de amêndoa, para deixar a pele mais lisa e sedosa,,, – Roku começou a gargalhar – Você usa creme feminino!! – Ele saiu gargalhando.
– ROKUU!!!
Logo que sai do banho e me arrumei, fui até a sala.
– Está sedoso, garoto?
– Não enche. – abri a porta da frente – Vou dar uma saída, preciso ir no centro comprar minha edição semanal da revista Gamer.
– Não tem jeito, tenho que ir também mesmo não querendo.
– Verdade, as vezes esqueço que está me assombrando.
– Não estou te assombrando!
– Vamos logo.
14:28 h.
Saindo da loja, avistei Kiria escorada no parapeito da sacada de uma pousada do outro lado da rua. Ela estava com um fone de ouvido verde, concentrada, fitando o céu. Na hora veio a mente suas palavras.
“Você entrou em uma guerra onde é matar ou morrer. Se tiver misericórdia de seu inimigo, morrerá.”
Ela me percebeu olhando, então de forma que me deixou surpreso, ela sorriu e acenou antes de voltar para o quarto.
Voltei para casa e fiquei o resto do dia intercalando entre jogos online e pesquisa sobre karma, fantasmas, invocadores, templários e sobre o tal Rei de Eternia, indo dormir de madrugada.