Capítulos (1 de 1) 26 Mar, 2024

Casamento Arranjado [Conto]

Naomi era a garota mais popular da escola, e também fazia aula de música. Enoki era um simples aluno de intercâmbio que usava o horário das aulas para desenhar. Por mais que fossem diferentes, por algum motivo, o sorteio sempre colocava os dois para fazer trabalhos em dupla. O que fez muitos desconfiarem que um dos dois manipulava os resultados para ficar perto do outro.

No momento em que o sininho do intervalo soou, todos os alunos se levantaram de seus lugares, menos um que estava distraído desenhando em sua mesa. O professor encarou o garoto, mas apesar de querer lhe dar uma bela bronca, resolveu deixar para depois, pois seu estômago clamava por alimento. Ele pegou a sua maleta e foi em direção a porta.

Um minuto depois, a porta se abriu. Parece que alguém se lembrou do garoto que desenhava na terceira mesa da última fileira, do lado da janela que refletia uma luz agradável para um destro artista. Ela caminhou pela sala, passando entre as cadeiras até finalmente chegar perto dele; para chamar sua atenção colocou uma marmita em cima do papel.

O rapaz encarou a garota franzindo a testa, mas ela retribuiu o olhar ríspido dele com um sorriso meigo. Revelou que tinha duas marmitas e por fim acenou com a cabeça para que a seguisse.

Eles foram para o lado de fora da escola. Do outro lado da rua tinha um parque, com uma grama verde e algumas árvores; um local que famílias com crianças gostavam de frequentar, por isso lá também tinha um trepa-trepa, um escorregador e uma caixa de areia; os dois caminharam até um banco que ficava embaixo da sombra de uma árvore, ali sentaram juntos.

Enoki perguntou o motivo de ela ter o chamado para almoçar junto. Ela ficou um pouquinho nervosa com a pergunta, nem tentou se justificar, apenas virou a face para o outro lado e começou a abrir sua marmita para começar a comer. Ele deduziu que talvez ela o tenha chamado para almoçar naquele parque, para que começassem o trabalho assim que terminassem de comer.

De repente uma música eletrônica tocou e interrompeu a paz do almoço. Naomi recebeu uma ligação de seu pai, já sabendo qual era o assunto, pois ele sempre pedia a mesma coisa. Ela respondeu que não estava a fim de conhecer outro pretendente e que era para ele esquecer aquela ideia de fazê-la se casar, por fim desligou na cara dele.

— Seu pai de novo?

— Pois é… ele não cansa de encher o meu saco — respondeu bufando com a boca. — Talvez ele me deixasse em paz se aceitasse algum dos pretendentes dele, mas sabe como é… uma Idol não pode se casar.

— Ué, por que não?

— “Idol” o nome já diz, é um ídolo. Os otakus, principalmente, gostam de garotas que eles não podem ter e que ninguém terá.

— Realmente não entendo a lógica disso.

— Também não entendo a lógica de você ter vindo do outro lado do mundo para tentar ser mangaká aqui — respondeu de maneira debochada.

— São duas situações completamente diferentes.

De repente, Naomi recebeu outra ligação, e dessa vez a voz do seu pai estourava o áudio.

— Escuta aqui Naomi, se você não aparecer aqui amanhã à noite de novo, vou cortar sua mesada!

— Como é que é?! Você não pode fazer isso, como vou pagar as mensalidades das minhas aulas de música?! — Os olhos dela arregalaram de surpresa.

— Não é problema meu! — Imediatamente desligou na cara dela.

A garota começou a puxar o próprio cabelo, enquanto Enoki olhava para ela sem nenhum ar de preocupação, pois para ele isso não era de sua conta. De repente ela parou, se virou em direção dele e o encarou nos olhos de uma maneira bem constrangedora.

— Por que está me olhando desse jeito? — O rosto do garoto ficou corado.

— Não gostaria de ajudar sua amiga em um momento de dificuldade? Se você fizer um registro de casamento comigo… Eu posso fazer qualquer coisa por você… o que me diz?

— De onde tirou essa ideia maluca?! E desde quando somos amigos? Só estamos andando juntos no momento, pois estranhamente sempre somos forçados a fazer dupla em trabalhos da escola — respondeu o garoto enquanto pegava um pedaço de frango para colocar na boca.

— Não seja ridículo, eu sei que você tem uma queda por mim. Sei também que você suborna o professor para sempre sortear nós para fazermos dupla.

O garoto imediatamente começou a engasgar ao ouvir aquilo — De onde você tirou isso?!

— Isso é muito óbvio.

O garoto sem muita paciência colocou a tampa na marmita, devolveu para ela e sem dizer mais nada, foi embora dali.

O garoto ainda irritado caminhou pelo corredor rumo a sua sala, mas antes de pegar na maçaneta, a porta foi aberta por dentro; ele deu de cara com o seu professor que o encarava com uma expressão bem séria, o que o fez ter a sensação de que estava encrencado.

O professor informou que o desempenho dele havia caído e que se não buscasse tirar melhores notas nas próximas provas, correria um sério risco de perder a bolsa. Agora era o Enoki que estava quase arrancando o próprio cabelo.

De repente, alguém tocou em seu ombro; ele já imaginava quem era; aquela garota com certeza havia escutado toda a conversa.

— Parece que você também está em apuros, meu amiguinho.

Enoki apenas abaixou a cabeça, pois agora estava à mercê da Naomi.

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Na noite do dia seguinte, Enoki que vestia paletó e gravata ficou esperando do lado de fora do prédio onde morava. Pouco tempo depois, um carro branco parou perto da calçada; de dentro dele saiu um homem musculoso de óculos escuros, que chamou a sua atenção e abriu a porta que dava acesso ao banco de trás.

O garoto meio receoso se aproximou. Ele viu a Naomi no banco de trás, que logo o comprimentou com um sorriso meigo. Ela estava usando um vestido vinho e uma jaqueta jeans; era também possível sentir o aroma do perfume dela que se impregnava no interior do automóvel.

Enoki ao sentar, sentiu que o estofamento do banco era bem confortável e o couro parecia bem bonito também, haviam até telas para assistir televisão na traseira dos bancos da frente. Mas ao se distrair acabou inclinando a cabeça demais se encostando sem querer no ombro da Naomi; o que deixou os dois sem graça; para disfarçar o constrangimento ele olhou para o lado e colocou seu cinto de segurança.

O carro andou pelo centro da cidade, Enoki viu pela primeira vez na janela estabelecimentos iluminados, restaurantes, karaokês, e até uma comic shop que ele nem imaginava que tinham naquele lugar. Conforme o percurso foi avançando o garoto ia ficando mais e mais nervoso, e o ápice da coisa veio quando avistou uma casa grande com muro de grades de metal, que do lado de fora tinha um lindo jardim de rosas e uma piscina que refletia o brilho da iluminação da casa.

— Como me coloquei nessa situação, meu Deus?! — lamentava enquanto tentava esconder o rosto entre os joelhos.

— Se prestasse mais atenção na aula, ao invés de ficar só desenhando, você não estaria nessa situação.

— Mas eu não tive escolha! A bolsa é usada para pagar a mensalidade da escola, mas para pagar aluguel, energia e alimentação eu preciso fazer um bico. Por causa disso, não tenho tempo pra desenhar meu mangá.

— Calma, eu vou cumprir minha parte do acordo. Você vai morar comigo, então não terá mais problemas pra se sustentar e vai poder se concentrar em seu mangá.

— Só não me sinto confortável de ter feito o registro de casamento assim tão depressa.

— Relaxa, não somos um casal de verdade, vamos dormir em quartos separados. A certidão é apenas uma formalidade pro meu pai parar de encher o saco.

O carro passou pelo portão; o casal foi muito bem recebido na casa pelos empregados. A casa da família da Naomi parecia ainda maior vista por dentro, haviam vários cômodos e o corredor parecia não ter fim; nas paredes haviam diversas fotografias. Ao chegarem na sala, encontraram um homem de cabelo grisalho vestido de paletó e gravata; que estava sentado em sua poltrona lendo um livro e fumando um charuto.

Quando o senhor Suzuki, notou a presença deles, cumprimentou sua filha, e ela apresentou o Enoki a ele. Por fim, o pai dela disse para ficarem à vontade e que podiam se sentar no sofá que estava ali perto.

Naomi perguntou onde estava o tal pretendente dela; o pai respondeu que ele havia tido uma infeliz dor de barriga e por isso não poderia vir. Ela então muito confiante revelou que aquele garoto que estava do lado dela era seu esposo, até mostrou para seu pai a certidão de casamento. Ele pegou e analisou a certidão, mas apenas deu mais uma tragada em seu charuto, não esboçando nenhuma surpresa.

— Seja bem-vindo à família Suzuki, filho. Cuide bem da minha filha.

— Me sinto honrado, senhor Suzuki. Darei meu melhor — respondeu o garoto meio incrédulo com o que estava acontecendo.

Um tempo depois, o jovem casal se despediu e foi embora. Depois disso o pai da Naomi esboçou um sorriso de satisfação, pois seu plano havia dado certo. Como imaginou, de tanto pressioná-la, ela acabou fazendo justamente o que ele queria, agora tinha garantias da continuidade da descendência da família Suzuki. De repente Naomi retornou e interrompeu os pensamentos dele, ela queria um adiantamento, pois havia acontecido uma emergência.

No dia seguinte, a garota foi cedo para a escola. Ela se encontrou com o professor na sala, e lhe passou o dinheiro que estava devendo. Antes de sair ele avisou para ela que haveria mais trabalhos em dupla na próxima semana, e no final piscou um dos olhos.

O garoto viu o professor saindo da sala. Quando foi pegar na maçaneta a porta foi aberta por dentro, acabou dando de cara com a Naomi.

— O que você e o professor estavam fazendo na sala, a essa hora da manhã? — interrogou desconfiado.

— Ele só estava conversando comigo. Me pediu para te ajudar com os estudos, para que você vá bem nas próximas provas e mantenha sua bolsa. 

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